A cerimónia da privatização da chuva
A cerimónia da privatização da chuva
Acrílico e carvão s/ tela 2 x 100 cm x 81 cm
Pintura de Artur Oliveira
                                                                 

O azul celeste é um manto
Que os senhores puseram sobre o firmamento,
Para sermos mais felizes.
Estão hoje em festa.
Lá, num lugar longe da Terra, que os suja…
Eles celebram no pátio dos argumentos.

Estão suspensos… consigo vê-los
Na translucidez opaca das palavras.
Celebram… celebram sorrindo com a solução para a humanidade.

O céu está limpo, sempre será limpo.
Não chove. Não choverá.
Guardaram a chuva.
São um guarda-chuva que nos poupa as intempéries.
Agora, só chove lá em cima, onde eles sofrem, pelo povo,
O custo da construção, o custo da civilização...

A água fria da chuva jamais tocará o meu rosto seco,
Os meus lábios jamais saberão o sabor
Da água que viaja, incolor,
Circularmente pelos milénios do planeta.
As nascentes estão fechadas,
Os rios vigiados,
As fontes são uma lembrança poética
De um futuro que pode não existir.

Porque eles sabem sempre o melhor,
Porque eles sabem a solução quantificada
Para toda a riqueza do planeta,
Da riqueza de todos nós…
Mas eles sabem o preço,
Por isso festejam,
O preço da existência:
O preço da água da chuva!

Quando quiseres sentir o sabor da água,
Terás de pagar, pagar o preço por estares vivo.
Porque eles sabem o custo,
O custo que cada um custa ao planeta:
Eles são os seus senhorios!

Poesia de Ricardo Oliveira