O sentido
de Dialogarte
A cor das
palavras
A aparente
liberdade da formatação
A selecção
do poeta
Dilemas
A
eternidade escreve-se ...
Vamos sonhar com lucidez
Linhas
temáticas I
Linhas temáticas II
Linhas temáticas III |
A
privatização da chuva
Raro é o momento em que
olhamos a sociedade e a achamos justa. Por vezes, quando pensamos
como deveria ser a humanidade, vemos que há tanto de errado que
quase não encontramos uma solução. A fome, a pobreza, a
marginalização, o desrespeito do homem pelo Homem…
Em “A cor das palavras”,
pensamos que estes problemas têm uma mesma origem: a cobiça e a
ambição sem medida de alguns homens que retiram demasiada riqueza da
sociedade, deixando os restos para os outros. O problema nasce
então, como diz António Vieira, da certeza que “…vos comeis uns aos
outros. Grande escândalo é este, mas a circunstância o fez ainda
maior. Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem
os pequenos. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos
comeram os grandes, bastara um grande para muitos pequenos; mas como
os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos, nem mil, para
um grande”.[1] Padre António Vieira refere-se aos peixes para
ensinar aos homens os seus defeitos na justiça social.
Na verdade, hoje em dia, os
homens insistem em “comer-se uns aos outros”, deixando a igualdade e
a dignidade, que compete a cada ser humano, no plano das palavras,
distante, por isso, da concretização em acção. Neste sentido,
assistimos à apropriação dos recursos naturais por parte dos
grandes, vendendo-os como se lhes pertencessem, provocando
desequilíbrios na distribuição da riqueza.
“A cor das palavras”
insurge-se contra aqueles desequilíbrios sociais. Procura, através
da crítica, por vezes humorística, trazer a público algumas das
injustiças em que a sociedade é pródiga.
Salientamos, a título de
exemplo, uma das nossas obras, “A cerimónia da privatização da
chuva”, em que satirizamos, pelo ridículo, a possibilidade, cúmulo
da ambição, do homem privatizar a água da chuva. Nesta obra,
denunciamos a necessidade que muitos homens têm de produzir lucro
desmedido sobre tudo, mesmo o impossível que não lhe cabe, mesmo
quando explora recursos pertencentes a toda a humanidade.
“A cor das palavras” é, deste
modo, um projecto artístico que pretende pensar a sociedade, liberto
de qualquer escola ou posição partidária; pretende pensar, dizíamos,
o homem e o seu lugar no mundo. É um projecto que produz um diálogo
entre duas linguagens distintas, a pintura e a poesia,
interligando-as numa mesma obra, fazendo nascer a partir de um tema
uma obra cuja identidade dual desagua numa unidade artística.
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[1] Sermão de Santo António
aos Peixes, padre António Vieira.
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